Sunday, September 03, 2006

"- Foi uma palhaçada. Mas não tem importância. Olhem: comunico-lhes, solenemente, que está fundado o terrorismo.
Base do novo movimento: preconizar e difundir o terror, de todas as maneiras, em todas as suas manifestações. O Terror nas Letras, cujo protótipo seria a novela "Metamorfose", de Kafka.
- Kafka era um terrorista. Incentivar todas as situações terroristas, estabelecer o pânico, lançar o terror.
- E a solução? - perguntou Mauro.
- A solução é a conduta católica - respondeu o amanuense Belmiro.
- A solução é o próprio problema, sabe como é? Não há solução. Imagino a seguinte cena: um congresso de sábios, os mais sábios do mundo, que se reuniram para resolver o problema dos problemas, o problema transcendental, o Problema, tout-court.
- O problema o quê?
- Tout-court. Vá à merda.
- Ah, tout-court. Merci.
- Pois bem: estão reunidos, os sábios, a postos para começar a trabalhar, encontrar a solução do problema, e o Presidente do Congresso dá por iniciada a sessão, anunciando que vai, enfim, dizer qual é o Problema que os reuniu. Faz uma pausa, e declara solenemente: 'Meus senhores! O problema é o seguinte: Não há problema'
- E daí?
- Daí os sábios terem de resolver o problema da inexistência do problema. É o terror.
- Confesso que não entendo.
- Vocês não entendem porque são burros: no nosso caso, é a mesma coisa. Só que há o problema, o que não há é a solução. Logo está solucionado.
- E qual é o problema:
- O problema é o terror.
- Ah!
Calaram-se, os três, e riram, deslumbrados à idéia de que agora sim, estavam completamente doidos - os pais tinham razão.
- Es una cosa terriblea, la inteligencia!
- Unamuno não era terrorista.
- Dê três exemplos de situação terrorista.
- Um grito na igreja, uma gargalhada no velório, um árabe no elevador.
- Muito branco. É o que se pode chamar, apenas, de 'terrorismo cor-de-rosa'. O verdadeiro terrorismo é o absurdo mais terrível, por exemplo: o do homem que se apaixona por um fio de cabelo da amada, e quer viver com ele, dormir com ele, ter filho com ele...
- É, meus amigos, o inevitável aconteceu.
- Bom lema para o terrorismo: O Inevitável Aconteceu! Se considerarmos o aconteceu, aí, como substantivo e não como verbo.
- Precisávamos é de uma coisa para símbolo.
- A coisa - prosseguiu Eduardo: - A Coisa é o símbolo. Ninguém sabe o que é. Está em toda parte e não está em lugar nenhum. Assume todas as formas. Pode ser um sentimento, um objeto, uma cor - só que tem de ser uma coisa, isto é: um substantivo. Por isso concluímos, há pouco, que aconteceu não era verbo. Onde a Coisa estiver, aí estará o terror.
Os outros dois ouviam, um tanto apreensivos. Eduardo falava sem parar:
- Me lembrei de uma coisa inventada por Salvador Dali - A coisa era um pão. Sairia no jornal com manchete assim: "O inevitável Aconteceu - A Descoberta do Pão". Um pão monumental, exatamente igual a um pão-francês comum. A diferença estaria no tamanho: mediria dois metros de comprimento. O pão era encontrado na rua, levariam para a polícia. Estará envenenado? Conterá explosivo? Propaganda política? Os comunistas, pão-para-todos? Anúncio de padaria? Os jornais comentavam e discutiam o que fazer do pão. Era só o assunto ir esfriando e um pão maior ainda, de cinco metro, amanhecia atravessado no Viaduto. Toda a cidade empolgada com o mistério, a polícia desorientada, o pão analizado nos laboratórios. E continuava o problema: que fazer com ele? Para despistar, um de nós escrevia um artigo sugerindo que fosse cortado em milhares de pedaços e doado à Casa do Pequeno Jornaleiro. No Rio, em São Paulo, Recife, Porto Alegre começavam a aparecer pãe, cada vez maiores, nos lugares públicos. Eram os membros de uma sociedade secreta já fundada, a Sociedade do Pão, que começavam a trabalhar. E um dia surgiria outro pão gigantesco em Roma, outro em Londres, outro em Nova Iorque. A humanidade deixaria de se preocupar com seus problemas, as guerras seriam esquecidas, até que resolvessem o mistério do pão. Era a vitória pelo terror.
- Você já pensou no tamanho do forno para assar esse pão?
- Isso não é problema para nós: a idéia é de Salvador Dali, que, aliás, é um vigarista.
- É uma besta.
- Falso terrorista.
- Abaixo Dali!
A noite avançava e, de súbito, a Praça ficou inteiramente deserta. Fora-se o último casal de namorados e só restavam os três, no banco de sempre: o coreto vazio, o busto de D. Pedro II entre roseiras, o repuxo no lago.
- Vamos descer, pessoal? - propôs Hugo. - Comer alguma coisa.
- Ou alguém - sugeriu Mauro : - Meu reino por uma mulata.
- Imaginem se o homem tivesse capacidade sexual limitada, digamos para trinta vezes. Idéia terrorista.
- Idéia cretina. Eu já teria gasto a minha há muito tempo.
- Os pródigos: aos vinte anos só teriam uma de reserva.
- Não, minha nega, tenha paciência, só me resta uma, não posso gastar com você.
- E os econômicos? Se continham a vida inteira e, na hora de morrer, se queixariam: e eu, que ainda tinha vinte e sete!
Mauro se ergueu, incontido:
- Propnho que gastemos imediatamente uma das nossas."

De vez em quando eu, Marianny, Lethícia, Karyne e Zé Neto temos idéias terroristas também.
Sonhar em ser um personagem de desenho; comer feijõezinhos de todos os sabores; carro movido a ar, com turbinas que usassem o ar como combustível; sair em um carro, viajando pelo Brasil, quando formarmos no Ensino Médio; Nadar na prainha artificial do Itajá; Passar na UnB pra jogar xadrez e basquete na quadra que faz fundo com a nossa casa...

4 Comments:

At 9:28 AM, Blogger Maísa Monte said...

Esqueci de dar créditos:

Texto extraído do livro "O encontro Marcado", Fernando Sabino.

 
At 9:40 AM, Anonymous Anonymous said...

ashaiushaihsiah mahhhhhhhhhh
é legal no inicio mi confundiu um poko mais depois eu fui compriendendoo!!! haiuhsiahsi
imagina se pudessemos dá apenas 3 vezes? credoooooooo ...
e eu num tenhu idéias terroristas naumm ..
e nós vamoss dá a volta no brasil sim! BJUXXX TAH MASSA ISSA BOSTA AKI!

 
At 1:26 PM, Anonymous Anonymous said...

Viva as idéias terroristas!!
E VIVA EDUARDO MARCIANO, My hero! =DDDDDD
Você é beeem atoa não?! Pra escrever essa parte inteira do livro?!
Eu ficaria espantada se a Ushida tivesse entendido tudo desde o começo.. sahsauhsu!
Um texto todo complexo do Encontro MArcado e a Marianny só absorve a última parte! Só ela mesmo!!

Essa é uma das melhores partes do livro!! Eduardo, MAuro e Hugo são os melhores, com certeza!! =D

 
At 9:45 PM, Blogger karyne said...

Depois de mais de 2 anos do comentario postado, eu venho como forma de terrorismo me manifestar, e que possamos sempre e sempre continuar tendo idéias terroristas sempre que nos encontrarmos na mesma cidade perdida, pensando no mundo e lembrando que como Ramalho "Você ainda pode sonhar..."

Estou realmente nostalgica!

 

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